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A crise internacional marcada, principalmente, pela retração do crédito e redução da atividade econômica entra em sua segunda fase

A crise internacional marcada, principalmente, pela retração do crédito e redução da atividade econômica entra em sua segunda fase. Para enfrentá-la, os governos estimulam suas economias, pois o consumidor se retrai com receio do desemprego. O empresário reduz sua produção e provoca desemprego e, em efeito cascata, caem mais ainda as vendas e a produção. O crédito se torna mais seletivo e caro pelo risco de elevação da inadimplência.

Se o mercado for deixado à própria sorte, o colapso é acelerado e, provavelmente, inevitável. Por essa razão, mais uma vez o Estado é chamado a intervir com medidas contracíclicas. Sob o ângulo fiscal, são efetuadas reduções de tributos e/ou dilatação de prazos para seu recolhimento e ampliação de despesas nas áreas social e de infraestrutura. Sob o ângulo monetário, a redução de juros e o aumento da liquidez podem criar condições favoráveis para estimular a retomada de créditos.

A preocupação com a inflação ficou secundária, com queda de preços em clima de acirramento da concorrência pela retração do consumo.

Neste cenário, o Brasil ainda constitui exceção. Indicadores de novembro último apresentaram queda nas taxas e expectativas de inflação, no ritmo de crescimento da produção, das vendas e da arrecadação de tributos – que não foram suficientes para o Banco Central reduzir a Selic, mantida em 13,75%, na reunião do Copom de 10 de dezembro. A autoridade monetária continua atribuindo maior peso aos riscos de inflação devido à desvalorização cambial, pois considera necessária a contenção da demanda, ainda elevada. Agiu na contramão de outros bancos centrais, que agilmente efetuaram quedas expressivas nas taxas básicas de juros, muitas já próximas de zero. Ao mesmo tempo, no Brasil, as instituições financeiras elevaram as taxas de juros às empresas e às pessoas, em ação pró-cíclica.

Dois dias após a decisão do Copom, o Ministério da Fazenda anunciou um modesto pacote de estímulo à atividade econômica, visando assegurar um crescimento de 4% em 2009: redução do imposto de renda da pessoa física, gerando R$ 4,9 bilhões para ativar a demanda; redução do imposto sobre operações financeiras (IOF) de 3,38% para 1,88% ao mês nas operações de crédito direto ao consumidor e cheque especial; e redução do imposto sobre produtos industrializados (IPI) para automóveis, exceto veículos de luxo, que continuarão pagando 25% de imposto. Produzirão uma renúncia de R$ 8,4 bilhões, ou 1,2%, da arrecadação federal. Outra providência consiste no uso de reservas cambiais para ajudar empresas a rolar empréstimos no exterior que vencem entre setembro de 2008 e dezembro de 2009. Novas medidas ocorrerão.

Políticas fiscais e monetárias conservadoras podem intensificar no país os efeitos da crise. Importante seria priorizar a atividade econômica, e não a inflação, pois o processo deflacionário já começa a atingir Estados Unidos, Europa e Japão e queda da inflação nos países emergentes.

Na área monetária o Banco Central poderia reduzir a Selic, impor limites aos juros cobrados pelos bancos e liberar integralmente os depósitos compulsórios dos bancos no BC.

Na área fiscal, deve-se apostar na queda da elevada carga tributária. A alta regressividade do sistema tributário reduz a competitividade dos produtos brasileiros em face dos estrangeiros e o poder aquisitivo da classe média e de menor renda. Quem ganha até dois salários mínimos paga 49% em tributos e acima de trinta salários, 26%. Apostar todas as fichas na reforma tributária é arriscado. A perspectiva de sua aprovação diante de provável crescimento econômico deixou de existir e receios de queda de arrecadação acirram a disputa federativa por recursos diante de novo sistema tributário.

Diante de perspectivas de baixa arrecadação, os governos podem priorizar a racionalização de despesas para cumprir suas metas.

No caso do governo federal, a economia de R$ 100 bilhões/ano pela eventual redução da Selic ao nível médio dos emergentes poderia gerar investimentos sociais e em infraestrutura. Instrumentos para enfrentar a crise existem. Basta decisão para sua rápida aplicação. O tempo dirá.

Amir Khair é mestre em Finanças Públicas pela FGV