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Partidarização e oposição sistemática buscavam garantir a vitória de um candidato de oposição ao PT

A se confirmarem as últimas projeções dos institutos de pesquisa – agora, inclusive, do DataFolha –, as eleições presidenciais de 2010 serão decididas ainda no primeiro turno. E mais: será também confirmada a segunda grande derrota dos grupos dominantes de mídia, esta maior e mais formidável que a primeira, sofrida nas eleições de 2006.

É sabido que eleições presidenciais se ganham a longo prazo [Paul Lazarsfeld, 1953], e foi exatamente no longo prazo que a grande mídia apostou. A partidarização e a oposição sistemática – afinal assumida publicamente pela presidente da ANJ, em março de 2010 – buscavam, entre outros objetivos, garantir a vitória de um candidato de oposição à Presidência da República.

Uma impressionante homogeneidade passou a caracterizar a informação política disponível, sempre com “enquadramento” adverso e desfavorável ao governo Lula e à aliança de partidos que lhe dá sustentação. Assistimos a uma fabricação sucessiva de “crises”; a distorções e omissões seletivas de fatos e informações e a indisfarçáveis “artimanhas” estrategicamente articuladas para favorecer candidatos de oposição já durante a campanha eleitoral.

Apesar da total liberdade da imprensa – comprovada exatamente pela oposição unânime ao governo – a grande mídia apostou (e ainda aposta) no refrão estratégico de que a censura é um perigo iminente e de que persiste um resíduo autoritário no PT e no governo Lula, obcecado com o “controle social da imprensa”. Iniciativas como a 1ª. Confecom e o Plano Nacional de Direitos Humanos 3 foram violentamente boicotadas e combatidas.

Nesse sentido, trabalharam fervorosamente os principais jornais, revistas, emissoras de rádio e televisão e suas entidades representativas – sobretudo as três principais, Abert, ANJ e Aner – ao longo dos últimos anos.

Mesmo assim, a aprovação pública do governo e do presidente da República continuou batendo recordes históricos e a candidata apoiada pelo presidente Lula, segundo as projeções atuais (final de agosto), deve ganhar as eleições no primeiro turno.

O que teria outra vez dado errado para a grande mídia, acostumada a frequentes e vitoriosas interferências no processo político?

Acreditando ainda exercer um poder que já não tem e comportando-se como autista diante de uma nova realidade que é incapaz de compreender, a grande mídia não se dá conta de que o país mudou. E a formação da opinião pública e da decisão do voto também.

Para ficar somente com as mudanças ocorridas no campo das comunicações, sabemos, a mídia tradicional está em crise. Crise de credibilidade e de sobrevivência provocadas, entre outros fatores, pelo avanço tecnológico da convergência digital que trouxe a internet e sua avassaladora capilaridade social. Já são quase 70 milhões de brasileiros com acesso diário a um espaço público de debate e circulação de informações que, apesar de todas as limitações, oferece, de longe, muito mais interatividade, pluralidade e diversidade do que a velha mídia unidirecional.

Ademais, ao lado da mídia pública e da mídia “alternativa” que avançam, apesar de dificuldades quase intransponíveis, existe hoje uma crescente consciência crítica sobre a importância e a centralidade da mídia e, mais importante, sobre a comunicação como um direito humano fundamental, em parcela significativa da população.

É preciso que o próximo governo também se dê conta de que os tempos são outros e que o “ator” velha mídia não tem mais o poder do passado. Precisamos e devemos avançar na regulação democrática das comunicações e na formulação e implementação de políticas públicas que garantam à população brasileira o pleno direito à comunicação.

Venício A. de Lima é sociólogo e jornalista, autor de Liberdade de Expressão vs. Liberdade de Imprensa (Editora Publisher Brasil, 2010)