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Seja para trazer mais energia ao trabalho tão desgastante da política, seja para promover o diálogo com novas pautas e linguagens demandadas pela população, a renovação etária é essencial

O resultado das urnas da eleição alemã de 26 de setembro de 2021 surpreendeu em muitos aspectos. Nas análises, maior atenção tem sido conferida à disputa pelo sucessor de Angela Merkel, que deixa o cargo após 16 anos – e que havia se tornado a chanceler mais jovem da história alemã ao assumir o posto com 51 anos, em 2005.

O cenário geral para a sucessão de Merkel foi caracterizado por grande pulverização de votos e diferenças regionais. O Partido Social-Democrata (SPD), que há alguns meses chegou a aparecer em terceiro lugar nas pesquisas, acumulou a maior cota (25,7% dos votos) e deve indicar o próximo chanceler alemão – após acertar composições com outras legendas, processo que deve levar alguns meses. Já a União Democrata Cristã (CDU), partido de Angela Merkel, obteve seu pior resultado na história (24,1%). Verdes (14,8%) e liberais democratas (Partido Liberal Democrático, FPD, 11,5%) cresceram desde o último pleito e devem ser cortejados pelo SPD para a formação da coalizão que governará o país no próximo período. A esquerda do Die Linke obteve 4,9%. A notícia boa é que a ultradireita, da Alternativa para a Alemanha (AfD) (10,3%) está fora do jogo para a formação de uma coalizão governista.

Os resultados parlamentares, por sua vez, têm recebido menos holofotes e é sobre ele que vamos nos debruçar. Para começar, vale notar que a Alemanha elegeu em 2021 o parlamento mais jovem da história alemã: cerca de um terço dos parlamentares eleitos têm menos de 40 anos, ao passo que na legislatura passada essa razão era de um para sete.

A representante mais jovem é Emilia Fester, com apenas 23 anos, eleita pelos Verdes; já Max Lucks tem 24 anos e representa os liberais democratas. Ambos já afirmaram que pretendem se locomover de skate (Emilia) e bicicleta (Max) para o trabalho no parlamento. Outras novidades são Ria Schroder, 29, militante LGBTQIA+; Muhanad Al-Halak, 31, iraquiano que migrou para Alemanha aos 11 anos de idade e que vai representar os liberais democratas; e Awet Tesfaiesus, a primeira mulher negra eleita para o parlamento alemão, representando os verdes. Awet tem 47 anos e é nascida na Eritréia, tendo migrado para a Alemanha aos 4 anos de idade. A presença de migrantes tem crescido a cada eleição e das 735 cadeiras, 83 serão ocupadas por pessoas de famílias imigrantes ou de origem estrangeira.

Em que pese SPD e CDU tenham obtido maior porcentagem dos votos, a maior parcela da renovação veio dos verdes e dos liberais democratas. No espectro político, os verdes se localizam mais à esquerda e encampam prioritariamente as pautas das mudanças climáticas e da justiça social, enquanto os liberais democratas são mais conservadores e levantam bandeiras como as liberdades civis e a modernização digital.

Os dois partidos não apenas elegeram mais candidatos jovens, como também conquistaram maior parte do eleitorado juvenil, conforme mostra o gráfico abaixo, que retrata as preferências do eleitorado com menos de 25 anos e com 70 anos de idade ou mais.

O gráfico mostra que verdes, liberais democratas e Die Linke obtiveram parcela de votos de jovens até 25 anos superior à média de suas votações. Já os dois principais partidos, caracterizados com o que poderia ser uma política tradicional, conquistaram parcelas proporcionalmente maiores entre pessoas com 70 anos ou mais.

Vale lembrar que o direito ao voto na Alemanha se inicia aos 18 anos e a redução para 16 anos de idade é uma das reivindicações populares, com divergências entre os partidos. Social-Democratas do SPD, verdes e a esquerda do Die Linke são favoráveis ao voto aos 16 anos. Já os democratas-cristãos do CDU e os ultradireitistas da AfD são contrários. Liberais democratas não possuem posição fechada sobre a matéria.

Em que pesem as diferenças ideológicas entre verdes e liberais democratas, o espírito da renovação permite alguma aproximação entre as duas legendas. No pós-eleição, seus líderes postaram uma foto no instagram que deu o que falar. Essa aproximação inédita entre ambos foi publicizada antes mesmo que se reunissem com os dois grandes SPD e CDU.

Como sabemos, a renovação não é apenas ou sobretudo um fenômeno etário. O movimento do Gattopardo, de Lampedusa, mostra como é bem possível mudar para deixar as coisas como estão. No entanto, também sabemos que não é possível promover mudanças sem envolver e contar com a participação dos sujeitos e suas pautas. Ou seja, forma e conteúdo andam juntos e a renovação etária é essencial seja para trazer mais energia e força para o trabalho tão desgastante da política, seja para promover o diálogo com novas pautas e linguagens demandadas pela população.

Luiza Dulci é militante da JPT, integra o Conselho Curador da Fundação Perseu Abramo. É economista (UFMG), mestre em Sociologia (UFRJ) e doutora em Ciências Sociais, Desenvolvimento e Agricultura (UFRRJ)