Colunas | Cinemateca

Do realismo revolucionário à estética de Hollywood, uma coletânea de filmes da Rússia

O Encouraçado Potemkin - Direção de Sergei M. Eisenstein, União Soviética, 1925, 112 minutos. Distribuidora: Imovision  - Um dos mais importantes filmes da história do cinema, obrigatório em qualquer lista dos dez mais. Narra o levante de 1905, ensaio para a Revolução Russa, quando marinheiros se insurgiram contra os maus-tratos e confrontaram a hierarquia. Monumento ao gênio de Eisenstein, notável pela criatividade e pelas soluções estéticas. A cena em que o carrinho de bebê desgovernado despenca pelas escadarias de Odessa no coração do massacre até hoje é pastichada e citada. Filme mudo em branco e preto de alta arte; não tem herói, seu protagonista é coletivo.

 

Quando voam as cegonhasQuando Voam as Cegonhas - Direção de Mikhail Kalatozov, União Soviética, 1957, 97 minutos, p&b. Distribuidora: Continental - Dedicado a um assunto caro ao cinema russo: a Segunda Guerra Mundial, em que a então União Soviética perdeu 20 milhões de cidadãos. Ao gosto do grande painel épico, típico desse cinema. Uma história de amor, interrompida pela crueza de uma guerra que devastou o país e sobretudo sua juventude, causando tragédias como essas aqui retratadas. Ainda marcado pelo realismo socialista. Palma de Ouro em 1957.

 

 

Andrei RublevAndrei Rublev - Direção de Andrei Tarkovsky,  União Soviética, 1966, 205 minutos. Distribuidora: Continental Home Video - Tarkovsky destaca-se entre os diretores a surgir no período do chamado “degelo”. Seus filmes, artísticos e inventivos, fazem-se notar pela ousadia da pesquisa e pela beleza da realização. Neste, o protagonista é um monge do século 15, o maior pintor de ícones que a Rússia já produziu. Contestando o realismo socialista, entrega-se a uma perquirição da espiritualidade – aliás, novamente em voga hoje no cinema russo –, em meio aos horrores do mundo e à possibilidade de superação através da arte. O esplendor visual do filme, adequado a seu tema, conquistou o Prêmio da Crítica no festival de Cannes de 1969.

 

O sol enganadorSol Enganador - Direção de Nikita Mikhalkov, França/Rússia, 1994, 152 minutos. Distribuidora: Flashstar Home Vídeo -Um balanço do stalinismo em pauta cinematográfica. Ao contrário dos grandes épicos a que os russos são afeiçoados, focaliza um único bolchevique, agora meio retirado, que fora comandante do Exército Vermelho durante a guerra civil. Ele será apenas mais um a tombar na rede que Stalin lançou para sufocar qualquer oposição dos revolucionários históricos; e todos serão exterminados um a um, nos processos de Moscou dos anos 30. Do começo tchecoviano da primavera no campo ao pesadelo da queda. Oscar de melhor filme estrangeiro em 1995.

 

 

Arca RussaArca Russa  - Direção de Aleksander Sokurov, Rússia, 2002, 97 minutos. Distribuidora: Wellspring Media/Mais Filmes - Este filme arrisca um partido original: mostrar a história da Rússia sem sair de um museu. Aqui, o escolhido é o Hermitage, de São Petersburgo, antigo Palácio de Inverno dos czares e palco de muito da história do país. Além disso, é um dos maiores do mundo: os tesouros da Casa Imperial nada ficam a dever ao British ou ao Louvre. O próprio edifício é ilustrativo da cidade, jóia barroca erigida por Pedro, o Grande nos pântanos gelados do rio Neva. O filme, além de original, é belíssimo, e exemplar de uma profunda tendência do cinema russo, cujas excelências são o épico e o filme de arte.

 

Guardiões da noiteGuardiões da Noite - Direção de Timur Bekmambetov, Rússia, 2004, 114 minutos. Distribuidora: Fox - Perdido o público cativo com o esfacelamento do Estado soviético, os russos passam a aventurar-se em experimentos, para enfrentar a invasão hollywoodiana. Interessante tentativa de misturar elementos de blockbusters –  como Guerra nas Estrelas, O Senhor dos Anéis e a série de Harry Potter –, incorpora a distinção maniqueísta entre hostes da Luz e hostes das Trevas, à qual se acrescentam vampiros. Efeitos especiais, estética de videogame, choque sobre choque. Não falta o tema central de boa parte dos filmes de nosso tempo, que é a falência da paternidade. Maior bilheteria de toda a história do cinema russo, pode apontar caminhos.

Walnice Nogueira Galvão, crítica literária, integra o Conselho de Redação de Teoria e Debate