Colunas | Economia

É preciso que o país adote estímulos ao consumo interno ­ potencial ainda não explorado devido à má distribuição de renda

Um dos pontos centrais no combate à crise internacional é a defesa da produção e de empregos. Todos os países estão procedendo assim, incluindo os Estados Unidos, com o pacote de Barack Obama. Para tanto, devem ser ampliadas as despesas com investimentos e custeios do setor público. Aí surge o problema. De onde sairão os recursos extras? No caso dos países desenvolvidos, por meio da elevação do endividamento; no caso do Brasil, da redução das despesas com juros e, se necessário, do aumento do endividamento.

A crise está causando fortes quedas nas exportações dos países, direcionando parte desses produtos para seu mercado interno, o que junto com a baixa dos preços internacionais e do consumo fez despencar a inflação. O Brasil não foi exceção. Com isso, abriu-se espaço para uma queda maior da taxa de juros Selic. Muitos analistas já preveem que ao final do semestre fique abaixo de 10%. Nesse caso, as despesas com juros do setor público, que atingiram R$ 165 bilhões em 2008, podem cair para cerca de R$ 125 bilhões neste ano, com uma economia de R$ 40 bilhões.

Se for necessário o aumento do endividamento, há folga para isso, pois a relação entre a dívida e o Produto Interno Bruto no país é de 36%, abaixo do nível dos países desenvolvidos, que já ultrapassa os 60%.

Embora seja desejável a continuidade do estímulo às exportações, mediante reduções tributárias, oferta de crédito e redução de custos de logística, é preciso que o país adote medidas para estimular o consumo interno ­ potencial, mas não explorado devido à má distribuição de renda. O consumo pelo acesso a maior renda geraria compras no comércio, demandas por aumento da produção, investimento e geração de empregos, formando um círculo virtuoso.

Vários poderão ser os estímulos: maior oferta de crédito com redução das taxas de juros, desonerações tributárias e tarifárias (transporte coletivo, energia elétrica, gás, água e telefone), especialmente dirigidas à população de média e baixa renda, aumentos no salário mínimo, programas de distribuição de renda e inflação baixa, entre outros.

A expansão do crédito já está ocorrendo, mas as taxas de juros estão elevadas. Para reduzi-las, além de cortes na Selic, outras medidas podem ser usadas em função dos juros cobrados pelos bancos: reduções seletivas de depósitos compulsórios dos bancos no Banco Central, tributação progressiva sobre os lucros dos bancos e imposição de limites à aquisição de títulos públicos.

O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), caso cumpra parte significativa de suas metas, terá forte impacto na reativação da economia, ao gerar empregos, com melhorias na infraestrutura e redução de custos de logística.

A Petrobras poderia reduzir os preços do diesel, que encarecem os custos do transporte coletivo e de cargas; do gás de cozinha, que pesa no orçamento familiar das populações de baixa renda; e da gasolina, que atinge a classe média. Os preços dos combustíveis, especialmente da gasolina e do diesel, estão 50% acima do nível internacional.

Governos municipais e estaduais podem implantar medidas de políticas públicas que promovam o aumento do poder aquisitivo, como o barateamento do transporte coletivo, da alimentação, do gás, da água e de medicamentos, itens que pesam nas despesas familiares da população de renda média e baixa.

Políticas de abastecimento que aproximam produtores e consumidores de alimentos e reduzem custos de intermediação têm demonstrado sua eficácia em vários municípios brasileiros e podem contribuir para a expansão do consumo popular.

É de grande complexidade o enfrentamento da crise e não existem respostas mágicas nem previsões certeiras. O fomento ao debate é desejável e oportuno, diante da expectativa de que um conjunto ágil, articulado e coordenado de políticas seja implantado.

Amir Khair é mestre em Finanças Públicas pela FGV e consultor