As eleições municipais representam uma oportunidade única para os partidos do campo popular e democrático demonstrarem aos eleitores seu compromisso com programas, propostas e soluções para os problemas, bem como com os valores fundamentais da democracia, equidade, justiça, direitos humanos, proteção do meio ambiente e promoção de serviços públicos de qualidade, contrapondo-se às forças atrasadas e antidemocráticas
É uma ocasião de grande valor para promover o resgate da confiança pública e restabelecer o pacto entre eleitorado e eleitos a partir da noção de “coisa pública” e democracia representativa, buscando legitimidade em cada ação ao longo dos mandatos, não apenas durante o período eleitoral.
Para alcançar esse propósito, os partidos poderiam elaborar um “manifesto”, fundamentado em compromissos com políticas públicas e valores republicanos, exigindo que todos os seus candidatos e candidatas subscrevessem tais princípios. Eles teriam como base alguns “considerandos” orientadores de uma espécie de “carta-compromisso”, semelhante à que tive a honra de formular e incluir como anexo à cartilha do Diap com o título “Eleições municipais: orientação a eleitores e a candidatas e candidatos”.
A título de sugestão, propusemos os “considerandos a seguir”, porém, como se trata apenas de uma recomendação, cada partido poderá adequar a carta-compromisso aos seus princípios e prioridades, produzindo algo adequado à sua realidade:
“Considerando que o povo, na condição de eleitor, é o legítimo titular do poder e, ao conferir mandato a alguém para representá-lo, o faz com base na trajetória – política/pessoal/profissional/ética – da candidata ou candidato, respaldado no programa apresentado durante a campanha e na exigência de prestação de contas do seu mandato;
Considerando que o eleitor também espera que a candidata ou candidato, uma vez eleito e no cumprimento do mandato, seja autêntico e republicano no exercício das três dimensões da atuação parlamentar, a saber, representante da vontade popular, legislador e fiscalizador dos atos e gastos governamentais;
Considerando que exercer cargos eletivos demanda compreensão das necessidades e carências da sociedade e não apenas das preferências pessoais ou de grupos;
Considerando que a coerência entre discurso e prática é o que legitima o exercício da representação e da governança;
Considerando que o cidadão e os movimentos sociais, cívicos e éticos devem apoiar apenas candidaturas comprometidas com causas e projetos que coincidam com os interesses, aspirações, desejos e reivindicações dos munícipes;
Considerando que a descrença na política, nos detentores de mandatos e nos agentes públicos decorre da ausência de confiança na seriedade, na decência e no compromisso dos representantes para com os representados;
Considerando, ainda, que a ética e a transparência dos atos públicos devem ser premissas indispensáveis à relação de confiança entre representantes e representados.
As candidatas ou candidatos pelos Partidos Políticos que subscrevem este Manifesto assumem os seguintes compromissos:
1º. Ética na condução do mandato
Contratar apenas pessoas qualificadas e comprometidas com os princípios deste Manifesto para os gabinetes de apoio aos mandatos;
Patrocinar ou apoiar exclusivamente pleitos e proposições que sejam ética e moralmente defensáveis;
Rejeitar todas as propostas que vão contra o interesse dos munícipes ou que possuam caráter antirrepublicano;
Recusar chantagens, ameaças ou favores em troca de votos nos Legislativos; e
Não tolerar desvios de conduta
2º. Transparência e prestação de contas dos mandatos
Prestar contas do mandato e da atuação parlamentar, divulgando todos os pronunciamentos, votações e iniciativas no âmbito dos Legislativos;
Fomentar a transparência ativa, publicando a agenda institucional dos gabinetes de apoio aos mandatos;
Informar detalhadamente como são utilizadas as verbas de gabinete e as verbas indenizatórias; e
Divulgar de forma transparente a destinação das emendas aos orçamentos
3º. Lealdade ao programa partidário e aos seguintes compromissos
Apoiar e defender a regulamentação da Constituição Federal, da Constituição Estadual e da Lei Orgânica dos Municípios nos pontos ainda não regulamentados, além de empenhar-se pela sua implementação plena, especialmente no que diz respeito aos direitos e garantias dos cidadãos e aos princípios da ordem social, da tributação e da ordem econômica com impacto nos Municípios;
Fortalecer e defender as funções do Estado, sobretudo na oferta de serviços públicos de qualidade nas áreas de saúde, educação, segurança, meio ambiente e transporte, ao mesmo tempo em que valoriza a profissionalização do serviço público;
Apoiar e defender a legislação de proteção social, especialmente aquela com impactos positivos na qualidade de vida da população local;
Apoiar e defender os investimentos municipais em saneamento básico, habitação popular, desenvolvimento sustentável e atração de investimentos que promovam empregos, renda e inclusão social;
Apoiar e defender o aprimoramento do pacto federativo, visando garantir que as competências constitucionais sob responsabilidade dos municípios sejam devidamente financiadas, permitindo que os programas federais sejam elaborados e implementados de acordo com as diversidades e peculiaridades existentes no território nacional, além de adotar estratégias e políticas públicas voltadas para a redução das desigualdades regionais.
4º. Compromisso, participação e consulta ao eleitorado
Mediar e intermediar, de maneira transparente e sem buscar vantagens pessoais, as demandas dos movimentos sociais e das comunidades locais junto aos agentes públicos e privados;
Criar e manter canais de participação popular e de diálogo dos poderes públicos om os segmentos organizados da sociedade civil;
Ouvir a comunidade antes de propor políticas públicas;
Promover consultas periódicas sobre os temas relevantes da conjuntura nacional, estadual e municipal;
Apoiar a organização da sociedade civil e sua participação no processo político e nas decisões sobre políticas públicas”.
Com atitudes como essas, os partidos do campo democrático e popular certamente estariam contribuindo para:
1) aprimorar a representação política;
2) resgatar a política como valor fundamental da democracia;
3) destacar as diferenças em relação a partidos e candidata ou candidatos associados a posturas antidemocráticas e antipopulares; e
4) enfatizar propostas e a resolução de problemas em detrimento de julgamentos morais, em oposição aos inconsequentes que buscam mandatos por meio de perseguição e ressentimento.
Antônio Augusto de Queiroz é jornalista, analista e consultor político, mestre em Políticas Públicas e Governo pela FGV. É sócio-diretor das empresas “Consillium Soluções Institucionais e Governamentais” e “Diálogo Institucional Assessoria e Análise de Políticas Públicas”, foi diretor de Documentação do Diap e é membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social Sustentável da Presidência da República – o Conselhão.