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Estouro da bolha imobiliária americana gerou a crise no mercado de crédito que passou a economia real do mais poderoso país do mundo

O estouro da bolha imobiliária americana gerou a crise no mercado de crédito que passou a economia real do mais poderoso país do mundo. Os Estados Unidos estão atravessando um processo de estagflação (estagnação com inflação) cuja intensidade e duração é desconhecida.

A redução das taxas de juros e o pacote fiscal de US$ 150 bilhões do governo visam manter o mercado interno aquecido, mas vão no sentido oposto de uma solução de longo prazo para o país.

Seus fundamentos econômicos vêm se deteriorando desde o início do século, com déficits nas contas internas e externas superiores a 8% do PIB a cada ano. Isso significa que o povo americano tem vivido de forma artificial, gastando mais do que pode e sendo sustentado especialmente pelos países emergentes, que aplicam suas reservas em títulos do Tesouro americano. Parece que esse processo chegou ao limite, com o estouro da bolha imobiliária.

O dólar deverá continuar a se desvalorizar perante as demais moedas e os preços das commodities, como única forma de restaurar o equilíbrio macro-econômico do país, que passa pela redução do consumo dos americanos.

Em paralelo a esse processo, os países emergentes fortaleceram seus fundamentos econômicos, se livraram de suas dívidas e acumularam reservas para enfrentar a crise internacional, que seria inevitável. Nos últimos três anos, cresceram em média 7% ao ano, e os países desenvolvidos, 2,5%.

O Brasil não fugiu a essa regra, sobretudo a partir de 2003, quando reverteu o processo contínuo de perdas em suas contas externas e acumulou reservas suficientes para enfrentar a nova crise internacional. No início de 2003 nossas reservas eram de US$ 16 bilhões e agora atingem US$ 185 bilhões, nível equivalente ao de toda a dívida externa pública e privada do país.

Além disso, apostou suas fichas no fortalecimento do mercado interno e diversificou suas exportações, diminuindo a dependência das compras americanas e da possível redução no ritmo de crescimento de suas exportações.

O mercado interno vem reagindo bem aos estímulos do governo, em especíal os reajustes no salário mínimo, a ampliação dos programas sociais e a introdução do empréstimo consignado (empréstimo com desconto em folha de pagamentos). Para os próximos anos o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) deverá contribuir para o desenvolvimento da infraestrutura e da logística do país, ao mesmo tempo que injetará recursos na economia, apoiando o crescimento econômico.

A questão em debate é quanto acrise americana poderá nos afetar. Estaríamos suficientemente protegidos em face de uma possível queda dos preços de nossas commodities e do acirramento da concorrência internacional, que poderá reduzir nossas exportações? O mercado interno poderá compensar essas perdas?

Creio que estamos mais bem preparados para esse enfrentamento e o mercado interno tem espaço para crescer, caso o governo continue estimulando o consumo, como fez até agora.

Os riscos de inflação são baixos, pois a queda nos preços das commodities e o redirecionamento de parte da produção exportada para o mercado interno poderão garantir maior oferta de bens e serviços a preços mais reduzidos, o que permitirá, inclusive, a ampliação do consumo doméstico.

O sistema bancário brasileiro não se envolveu nos riscos dos empréstimos imobiliários americanos e acumulou lucros substanciais de dez anos cá. As empresas nacionais também se capitalizaram e estão mais sólidas econômica e financeiramente.

De qualquer forma, é conveniente reforçar as políticas de desenvolvimento econômico e social, especialmente diante de um quadro de incertezas quanto à dimensão e extensão dessa crise.

Amir Khair é mestre em Finanças Públicas pela FGV e consultor