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Votar apenas porque o candidato expressa rejeição a tudo que o eleitor também rejeita é um enorme risco. Se agir de modo irrefletido, poderá eleger seu próprio algoz

O presidente da República, no Brasil, personifica, em sua integralidade, o Poder Executivo e exerce, simultaneamente, três papéis: de líder da Nação; de chefe de Estado e de chefe de governo. Os dois primeiros são mais simbólicos. O verdadeiro estadista é aquele que preenche essas três dimensões do cargo e o faz com o espírito republicano e que, apesar do enorme poder que o cargo lhe confere, não o exerce de forma autocrática ou irresponsável.

Os principais atributos de um presidente da República são sua legitimidade e liderança, as duas condições que o habilitam a liderar a Nação, convencendo-a da importância, necessidade e conveniência de suas iniciativas, inclusive daquelas que eventualmente contrariem interesses. É o principal requisito para que conquiste e preserve a governabilidade. Isso é o que se chama de capital político.

Nesse papel, de caráter mais simbólico que prático, o presidente deve ser percebido como exemplo na defesa e no respeito à Constituição, na condução da ordem interna e na promoção da paz social entre os brasileiros, bem como na defesa da soberania nacional e no zelo pela defesa do Estado democrático de direito.

É tanto que no ato de sua posse, conforme previsto no art. 78 da Constituição Federal, o presidente é obrigado a prestar o juramento perante o Congresso Nacional, “prestando o compromisso de manter, defender e cumprir a Constituição, observar as leis, promover o bem geral do povo brasileiro, sustentar a união, a integridade, a independência do Brasil”.

O papel de chefe de Estado, cuja principal missão é bem representar o país e o povo brasileiro perante governos estrangeiros e organismos internacionais, além de autoestima e confiança, tem como pressuposto acreditar no Brasil e defender sua inserção soberana no mundo globalizado, inclusive para efeito de disputa de mercados. Esse papel requer uma postura altiva, mas não arrogante nem belicosa.

Presidentes subservientes e com síndrome de vira-lata são uma tragédia para o reconhecimento e a valorização do Brasil, porque se preocupam mais em reconhecer os méritos e importâncias dos outros países do que defender e valorizar o seu. De outro lado, um presidente que não saiba dialogar com seus pares tende a levar seu país ao isolamento e a gerar conflitos desnecessários.

No exercício dessa função, que na verdade é missão, o presidente também se constitui em comandante em chefe das Forças Armadas, tanto para a defesa da integridade do território e da soberania nacional quanto para auxiliar outros países em missões humanitárias. Um presidente que saiba conciliar essas tarefas será um estadista respeitado mundialmente.

O papel de chefe de governo, entretanto, é o que exige mais tempo do presidente. Nesse aspecto compete ao presidente exercer a direção superior da administração federal, definir as políticas públicas prioritárias, conduzir a organização e o funcionamento do governo, promover a sanção, promulgação e publicação das leis, bem como expedir os decretos e regulamentos, entre outras atribuições relevantes.

É também na função de chefe de governo que o presidente escolhe os ministros, dirigentes de autarquias, empresas estatais e agências reguladoras, que são seus auxiliares mais importantes na condução do mandato presidencial. Um chefe de governo que não saiba escolher seus imediatos, e respeitá-los em suas funções, rapidamente perderá o respeito e a fidelidade de sua equipe de governo.

O presidente da República, ainda na dimensão de chefe de governo, deve se focar mais na definição de prioridades e na cobrança de resultados do que na condução pessoal dos assuntos, sob pena de excessiva centralização e atraso na tomada de decisão, além de deixar em segundo plano as outras dimensões do presidencialismo, que são indispensáveis à legitimidade da autoridade. Precisa saber delegar, mas, sobretudo, dar o norte ao governo e impedir que se torne um monstro de sete cabeças, em que cada setor pensa e age por si.

O presidente da República, como se vê, exerce o poder político, faz a direção superior da administração e, portanto, é o responsável por apontar os caminhos para a solução dos graves problemas brasileiros. Precisa ser mais respeitado do que temido e, principalmente, ter capacidade de diálogo para pacificar o país e reunir maioria para aprovar seu programa de governo.

Portanto, num cenário desses, os principais atributos do presidente devem ser o equilíbrio emocional, a tolerância, a calibragem nas decisões, a capacidade de formar consenso e não fomentar o ódio ou a sede de vingança, porque pessoas com esse perfil, em lugar de acender uma vela, limitam-se a condenar o país à escuridão.

Essas eleições vão exigir muita prudência e responsabilidade na hora de votar. O voto precisa ser refletido e muito bem pensado. Votar por diagnóstico, apenas porque o candidato expressa rejeição a tudo que o eleitor também rejeita, é um enorme risco. É preciso saber que propostas ele apresenta para resolver os problemas – e se tem equipe e base política para implementar o que promete –, e não a mera negação do status quo. Se agir de modo irrefletido, poderá eleger seu próprio algoz.

Antônio Augusto de Queiroz é jornalista, analista político e diretor de documentação do Diap