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Marco Aurélio era capaz de defender os interesses do Brasil na arena internacional com propostas sobre governança global, sistema financeiro e comércio mundial

O companheiro Marco Aurélio Garcia, MAG para seus companheiros mais próximos, além de militante e fundador do Partido dos Trabalhadores, era um intelectual de profunda erudição e que deu uma grande contribuição para a formulação da política externa do Brasil (PEB) na visão do PT. Visão esta que se somou à experiência e às posições de profissionais do Itamaraty, como os diplomatas Celso Amorim, Samuel Pinheiro Guimarães e outros, sintetizando a PEB ativa e altiva levada adiante nos mandatos dos presidentes Lula e Dilma, nos quais MAG atuou como assessor especial da Presidência para Assuntos Internacionais.

Marco Aurélio assumiu a Secretaria de Relações Internacionais do PT em 1990 e permaneceu à frente desta função até 2001, quando assumiu a Secretaria da Cultura da Prefeitura de São Paulo. Coube a ele coordenar a política internacional do partido após a primeira eleição presidencial disputada por Lula em 1989, quando quase chegamos lá e o PT demonstrou ser um partido viável eleitoralmente, o que ampliou em muito o prestígio internacional do partido, exigindo também a ampliação de suas relações e apresentação de propostas e formulações na área internacional.

Ironicamente, quando soube de seu falecimento, eu me encontrava no 23º Encontro do Foro de São Paulo, uma rede poderosa de partidos de esquerda latino-americanos e caribenhos que ele, ao lado de Lula e Fidel Castro, ajudou a fundar em 1990, tendo sido seu secretário executivo por dez anos aproximadamente. Ao longo de seu exílio político durante a ditadura, no Chile e na França, e depois como secretário do Foro, ele estabeleceu muitas relações políticas e pessoais com políticos de diversos países que contribuíram enormemente com as relações internacionais do Brasil durante os governos Lula e Dilma, pois muitos deles vieram a servir seus próprios governos desde a inauguração do período progressista na América Latina e Caribe em 1998. Alguns, como o socialista chileno Ricardo Lagos, inclusive chegaram à Presidência de seus países e mantiveram contatos regulares com MAG.

Marco Aurélio foi coordenador dos programas de governo de Lula nas eleições de 1994, 1998 e 2006 e de Dilma em 2010 e responsável pelo amadurecimento do PT em suas relações internacionais, deixando a posição meramente solidária com países e movimentos políticos do Sul do mundo para se transformar em um partido que, além da solidariedade e reconhecimento da importância dos países em desenvolvimento, também era capaz de defender os interesses do Brasil na arena internacional com propostas sobre a governança global, o sistema financeiro e o comércio mundial.

O companheiro Marco Aurélio foi um lutador até o fim e deixará saudades aos seus familiares, amigos e companheiros de partido. Por se tratar de um homem imprescindível, como dizia Brecht sobre aqueles que lutam a vida inteira, fará ainda mais falta nesse momento em que temos de impedir os golpistas que ocuparam o Palácio do Planalto de destruir o papel e o prestígio que o Brasil alcançou durante os governos do PT.

Que viva MAG!

Kjeld Jakobsen é consultor da área de Cooperação e Relações Internacionais