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Entre as eleições de 1989 e 2010, o contingente do eleitorado com preferência partidária pelo PT triplicou e mudou bastante o seu perfil sociodemográfico

Em julho de 1989 – no início da primeira campanha para eleição presidencial direta pós-redemocratização –, com apenas 8% da preferência nacional, o PT apresentava penetração bastante variada não só por idade e distribuição geográfica (v. TD 86 e TD 87), mas também por renda familiar mensal (RFM). Apenas no SE, com 11%, disputava a liderança em preferência partidária com o PMDB (12% no SE e líder isolado com 20% na média nacional). Nas demais regiões o PT caía para 4% no NE – atrás não só do PMDB, com 22%, como do então PFL, com 7% –, para 6% no Sul, próximo ao PMDB (9%), e para 7% na média das regiões Norte e Centro-oeste, contra 14% do PMDB (Ibope).

Oito anos mais tarde, com 13% no país (nov/97), o PT chegava a 16% no segmento com RFM (renda familiar mensal) superior a 5 salários mínimos (SM), contra 13% do PMDB, e tinha crescido sobretudo no segmento médio, entre 2 e 5 SM, atingindo 15%, contra 16% do PMDB. No segmento popular (até 2 SM), embora tivesse subido para 10%, ainda estava atrás do PMDB, que detinha 17% das preferências (Fundação Perseu Abramo). E, passados mais cinco anos, na pré-campanha de 2002, líder nacional com 21%, o PT estava à frente em todos os segmentos: no de maior RFM com 23%, contra 8% do PMDB e 6% do PSDB; entre 2 e 5 SM com 27%, contra 9% do PMDB e 5% do PSDB; e no de menor renda com 19%, contra 9% do PMDB (Criterium). Com movimentos bastante similares aos observados em termos regionais na pré e na pós-crise do mensalão/caixa dois, em abril de 2005 a penetração do PT por classe social (27% na média do país) também era homogênea em todos os segmentos de renda; e superada a queda aferida pelo Datafolha em dezembro (para 16%), já em março de 2006, por trás dos 23% na média nacional, observa-se recuperação no sentido inverso ao perfil encontrado em sua origem: a preferência pelo PT passa a ser decrescente quanto maior a renda – 25% entre os eleitores com RFM inferior a 2 SM, contra 20% entre os eleitores com renda mensal superior a 5 SM (Criterium).

Ou seja, ao longo dessa trajetória, alterou-se o perfil socioeconômico da composição do eleitorado com simpatia pelo PT: em 1989, dois terços dos 8% "petistas" pertenciam à classe média ou à elite econômica do país (67%), residindo em domicílios com RFM acima de 5 SM, e apenas 10% eram dos segmentos populares de menor renda (até 2 SM); da campanha de 2002 a abril de 2005, pré-crise, quando ainda cresceu nacionalmente de 21% para 27% das preferências, os "petistas" apresentaram distribuições que se aproximavam da estratificação do eleitorado: em torno de 50% com RFM até 2 SM e cerca de 20% na outra ponta, com renda familiar acima de 5 SM. Mas no pós-crise a popularização se acentua, invertendo o desbalanço, agora com 60% dos petistas no segmento de baixíssima renda e apenas 14% com RFM superior a 5 SM (mar/06).

Em suma, entre a eleição presidencial de 1989 e a deste ano, o contingente do eleitorado com preferência partidária pelo PT triplicou e experimentou importantes alterações no seu perfil sociodemográfico: permanece majoritariamente masculino, mas deixou de ser desproporcionalmente jovem; reverteu o desequilíbrio regional que o caracterizava em sua origem e, sobretudo, inverteu o peso das classes de sua base social – mais pela entrada de novos atores, popularizando-se, que pela perda do reconhecimento dos setores médios, ainda que isso também tenha ocorrido. Qual é o significado dessas mudanças para as eleições deste ano?

A composição social dos simpatizantes petistas e sua capilaridade constituem um diferencial sem par na comparação com a base dos demais partidos. Combinado com a força do voto retrospectivo (a avaliação positiva quase consensual do governo Lula), está dado o favoritismo de Dilma para a disputa em curso.

Gustavo Venturi é doutor em Ciência Política e professor do Departamento de Sociologia da FFLCH-USP ([email protected])