Na edição passada abordei as mudanças do perfil etário da base social petista, considerada a partir da preferência partidária, concluindo que o PT perdeu o diferencial de ser um partido de (ou para) jovens, como fora nos anos 1980, mas não deixou de ter apelo também entre os jovens - segmento em que ainda é, de longe, a primeira sigla de preferência. Vejamos agora as alterações na composição geográfica dos que manifestam preferência pelo PT nesse período.
Em julho de 1989 - no início da primeira campanha para eleição presidencial direta pós-redemocratização - com apenas 8% da preferência nacional, o PT apresentava variação acentuada na comparação das macrorregiões do país: apenas no Sudeste (SE), com 11%, disputava a liderança em preferência partidária com o PMDB (12% no SE e líder isolado com 20% na média nacional). Nas demais regiões, caía para 4% no Nordeste (NE) - atrás não só do PMDB, com 22%, como do então PFL, com 7% -, para 6% no Sul, próximo ao PMDB (9%) e para 7% na média das Regiões Norte (N) e Centro-Oeste (C-O), contra 14% do PMDB (Ibope).
Oito anos depois, em novembro de 1997, em um contexto não eleitoral, com 13% na média do Brasil e já disputando a liderança nacional com o PMDB (15%), o PT chegava a 15% no SE (contra 12% do PMDB) e tinha crescido sobretudo no Sul, atingindo 17%, contra 15% do PMDB. No NE e no N/C-O, embora tivesse subido respectivamente para 11% e 10%, ainda estava atrás do PMDB, que detinha 17% e 24% das preferências partidárias (Fundação Perseu Abramo). Cinco anos mais tarde, já em junho de 2002, na pré-campanha presidencial que conduziria Lula a seu primeiro mandato, o PT assume a liderança nacional - que mantém de lá para cá -, com 21% das preferências, contra 9% do PMDB e 5% do PSDB. Ganha em todas as macrorregiões: no SE com 26%, contra 7% do PMDB e 5% do PSDB; no NE com 16%, contra 9% do PMDB e 6% do PFL; no Sul com 20%, contra 9% do PMDB; e no N/C-O com 18%, contra 14% do PMDB (Criterium).
Esse cenário, com crescimento gradual da preferência pelo PT, perdura até a eclosão da crise do mensalão/ caixa dois. Em abril de 2005, logo antes das declarações de Roberto Jefferson, atingira 27% na média nacional - 26% no SE, 32% no NE (onde, na véspera da eleição de 2002, já saltara para 22%), 25% no Sul e 24% no N/C-O (FPA). Passados sete meses de denúncias de corrupção contra petistas históricos no governo Lula e no partido, com intensa reprodução nos meios de comunicação, em dezembro de 2005, nacionalmente, o PT despencaria para 16% (Datafolha), sem que nenhum outro partido ocupasse o espaço perdido pelo PT. Ao contrário, aumenta a não preferência partidária (de 44% em abril para 62% em dezembro), que atinge patamar semelhante ao de quase vinte anos antes (64% segundo Ibope de 1987, quando ainda estava em formação o quadro partidário atual).
Já em março de 2006, na pré-campanha à reeleição de Lula, o PT havia aparentemente se recuperado, só que não homogeneamente: embora volte a 23% na média nacional, chega a apenas 19% no SE, contra 30% no NE, 22% no Sul e 24% no N/C-O (Criterium).
Com essa trajetória altera-se o perfil geográfico do eleitorado com simpatia pelo PT: em 1989 (com 8% das preferências) mais de três quintos dos petistas (62%) estavam no SE (cerca de 44% do eleitorado) e apenas 14% no NE (com 28% do eleitorado); em abril de 2005, pré-crise, com 27% das preferências, os petistas apresentam a distribuição que mais se aproxima da distribuição do eleitorado: 43% residiam no SE, 31% no NE, 14% no Sul e 12% no N/C-O. Mas no pós-crise o desbalanço na distribuição dos petistas reaparece, agora com o SE abaixo de sua proporção no eleitorado (apenas 37%) e com o NE acima (34%).
Sendo a preferência partidária um fator importante para a definição do comportamento eleitoral, tal desequilíbrio é uma das causas, ao mesmo tempo que expressão, do favoritismo de Dilma no NE e de sua dificuldade relativa no SE.
Gustavo Venturi é doutor em Ciência Política, é professor de Sociologia da FFLCH-USP ([email protected])