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Ninguém cogita da extinção desse instrumento de governabilidade, as medidas provisórias. Então, o desafio é mudar o artigo 62 da Constituição

O melhor diagnóstico sobre o emprego de medidas provisórias, com força de lei, pelo Poder Executivo é do senador e ex-presidente da República José Sarney: sem elas o governo não governa; com elas, o Congresso não legisla.

Como ninguém cogita da extinção desse instrumento de governabilidade, o desafio é mudar o artigo 62 da Constituição, que disciplina a edição de MPs, para possibilitar ao Executivo o uso dessa norma com força de lei e ao mesmo tempo manter a prerrogativa do Congresso de votar matérias de iniciativa dos deputados e senadores.

Os presidentes da Câmara e do Senado, atendendo a apelo unânime dos parlamentares, estabeleceram como prioridade a alteração dos critérios para edição de medidas provisórias. O debate, entretanto, não pode ser emocional nem movido por ressentimentos, como ocorreu em 2001, quando foi alterado o artigo 62.

Em 2001, reagindo à reedição indeterminada de MPs, o Congresso resolveu punir o governo federal. Em lugar de buscar uma solução racional, que desse ao Poder Executivo condições de governabilidade e mantivesse a prerrogativa dos deputados e senadores de legislar, proibiu a reedição de MPs, limitando os temas passíveis de edição e, principalmente, determinando o bloqueio da pauta da Câmara e do Senado, passados 45 dias de sua edição.

Antes da Emenda Constitucional nº 32, de 11 de setembro de 2001, o governo editava medida provisória, inclusive com direito à reedição, mas o Congresso Nacional legislava concorrentemente, podendo priorizar os projetos em relação às MPs, já que elas podiam ser reeditadas e não bloqueavam a pauta, nem na Câmara, nem no Senado.

Com a nova regra, em lugar de ganhar mais atribuições, o Congresso perdeu o controle da agenda legislativa e deixou de legislar concorrentemente com o Executivo nos momentos de trancamento da pauta por medidas provisórias, o que tem sido praxe essa temporada de crise política.

As medidas provisórias têm-se revelado instrumento útil para tratar de alteração na legislação tributária; autorizar despesas urgentes, inadiáveis e imprescindíveis, por meio de créditos extraordinários; resolver problemas administrativos que não podem aguardar o trâmite normal de um projeto de lei; e veicular matérias que, por seu conteúdo polêmico ou capaz de atrair a atuação de grupos de pressão, não possam aguardar a tramitação ordinária, sob pena de modificações que as descaracterizem ou alterem seu escopo e abrangência.

Sob exame da Comissão Especial da Câmara, a Proposta de Emenda à Constituição nº 511/2006, de iniciativa do falecido senador Antonio Carlos Magalhães, a qual foram apresentadas trinta emendas, além da alternância de sua apreciação pelas Casas do Congresso, tem como escopo principal condicionar a vigência da medida provisória à aprovação de sua admissibilidade por uma comissão do Congresso, retirando a força de lei e a vigência imediata.

Ora, em situações como as mencionadas, condicionar a vigência de uma medida provisória ao juízo prévio de admissibilidade, com o arsenal de meios disponíveis à oposição para obstruir o processo decisório, seria pôr em risco a política pública, além de criar toda ordem de especulação sobre o tema objeto da medida provisória.

A solução, em face da alternância no poder, que permite que a oposição de hoje seja o governo de amanhã, passa por mudanças na legislação que levem a uma maior parcimônia no emprego de MPs. Três aspectos, entretanto, precisam ser preservados: a Câmara como Casa iniciadora, tanto pela tradição constitucional quanto por sua representatividade; o caráter de força de lei e vigência imediata; e, principalmente, o bloqueio da pauta, embora com maior racionalização, para não engessar os trabalhos legislativos.

Antônio Augusto de Queiroz é jornalista, analista político e diretor de documentação do Diap