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TV pode estar começando a perder sua soberania como principal fonte de entretenimento e informação

A televisão está em 95,1% dos lares brasileiros, segundo a recente Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) ao longo de 2008 e divulgada agora em setembro. Em contrapartida, há apenas 31,2% deles com computadores. Vistos assim, os dados brutos apontam uma evidente predominância da televisão sobre a internet como fonte de informação e entretenimento.

Outra pesquisa, entretanto, fornece alguns números para os quais vale a pena olhar. De acordo com estudo do Ibope consolidado em julho de 2009, há 64,8 milhões de brasileiros com acesso à internet, dos quais 36,4 milhões com conexão doméstica. Os demais usam a internet em locais de trabalho, pontos de acesso públicos ou pagos: bibliotecas, telecentros, lan houses.

A participação das classes C, D e E nesse bolo vem crescendo desde 2006. Naquele ano, juntas, as classes de renda mais alta, A e B, somavam 51,1%, contra 48,4% das de renda mais baixa; em 2008, a participação das classes C, D e E atingiu 51,3%, enquanto a das classes A e B ficou em 48,7%.

À medida que a internet cresce, a TV, de certa forma, encolhe. A telenovela do horário mais nobre, entre 20 e 22 horas, carro-chefe da programação da Rede Gobo, chegava sem muita dificuldade a picos de 60 pontos de audiência nos anos 80; hoje, as médias ficam em torno dos 40 nas medições do Ibope.

O número de TVs desligadas vem aumentando, sobretudo durante as férias escolares de verão. No último, chegou a um recorde: no sábado 31 de janeiro de 2009, havia apenas 36% de televisores ligados na Grande São Paulo entre 7 horas e meia-noite; no horário nobre (das 18 horas à meia-noite), mais gente ligou a TV, mas não chegou à metade do total de aparelhos: 48%. O recorde chamou a atenção de emissoras e anunciantes: especialistas do Ibope apontaram o trânsito nas grandes cidades e a internet como responsáveis. Ainda que episódico e localizado, o dado é significativo e também merece ser levado em conta.

Para onde todos esses números podem apontar? Para duas direções: em primeiro lugar, como tendência, para a transformação da internet como meio de comunicação de massa. Mesmo consideradas as enormes disparidades da sociedade brasileira e ainda que a TV tenha alcance em massa, a corrida para participar do mundo digital vem se acelerando. O fato de as classes C, D e E terem superado as classes A e B não é de pouca monta, como também não é desprezível pensar que há quase tanta gente que não tem computador em casa e, mesmo assim, acessa a internet quanto aqueles que o fazem em condições mais confortáveis, ou seja, com equipamento próprio e em casa.

Em segundo lugar, a TV pode estar começando a perder sua soberania como principal fonte de entretenimento e informação. E essa ameaça já vem provocando mudanças significativas, também, no modo de fazer televisão. Ainda que, de certa forma às cegas, formatos tradicionais, como a telenovela, venham sendo obrigados a responder às demandas, às impossibilidades e à impaciência desse novo telespectador.

O público das telenovelas da Globo vem caindo há cerca de dez anos. Hoje em dia, a média de audiência da novela no horário mais nobre, 21 horas, fica em torno dos 40 pontos. Ainda é muito, mas, se no início da década de 2000 marcava 50 pontos e nos anos 90 chegava facilmente aos 60, pode-se afirmar, sem susto, que há desinteresse crescente pelo formato – e, de novo, a internet aparece entre as explicações.

Qualquer projeto de televisão em particular e de comunicação em geral que se pretenda inovador, democrático tem de levar essa nova realidade em conta. Não, a TV não vai desaparecer. Nem a internet, tal como a conhecemos hoje, vai ser o único modelo de meio de comunicação de massa. O que já está sumindo é, antes, o telespectador clássico, que tendia a aceitar toda e qualquer imposição da TV em relação a seu tempo livre. O novo telespectador quer escolher – e  se só o mercado entender isso, estamos fritos.

Bia Abramo é jornalista, integra o Conselho de Redação de Teoria e Debate