Estante

O marxismo - esse conjunto de movimentos teóricos, políticos e revolucionários inspirados no legado de Karl Marx -tem deixado suas marcas na sociedade brasileira. Transposição mecânica de experiências estrangeiras para solo pátrio, ou busca de inspiração teórica e prática para resolver as contradições da nossa sociedade? Derrotas da dialética e dialética de derrotas. Esperanças sepultadas para sempre ou fantasma que rondará novamente a ordem capitalista estabelecida?

Estava na hora de aparecer um trabalho para reconstituir a História do marxismo no Brasil. Daniel Aarão Reis Filho e João Quartim de Moraes são os organizadores da obra, prevista para vários volumes, conforme planejamento que envolveu a participação de mais de uma dezena de professores universitários, estudiosos do tema, pertencentes ao Grupo de Trabalho Partidos e Movimentos de Esquerda, da Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs).

O longo processo de preparação da obra aparece resumido na apresentação do volume I da História do marxismo no Brasil, que traz seis artigos sobre o impacto das revoluções socialistas sobre os marxistas. Evaristo de Moraes Filho, em estudo erudito, traça o itinerário das idéias de Marx no Brasil, de meados do século passado até os anos 20 deste século, quando foi fundado o Partido Comunista do Brasil (PCB). João Quartim de Moraes trata da influência do leninismo de Stalin no comunismo brasileiro, num texto polêmico, que recupera formulações teóricas do "marxismo de Stalin". Os reflexos do VI Congresso da Internacional Comunista (1928-1929) no Brasil são abordados em artigo de Michel Zaidan. Daniel Aarão Reis Filho escreve sobre a importância do maoísmo na trajetória dos marxistas brasileiros, não só para os grupos explicitamente maoístas, como o PC do B e a AP, mas também pata organizações políticas que não se reivindicavam adeptas do líder da revolução chinesa. O impacto do XX Congresso do Partido Comunista soviético no pensamento do PCB nas anos 50 é o tema de Raimundo Santos, enquanto Emir Sader encerra o volume com uma avaliação sobre as influências da revolução cubana na esquerda brasileira. Não há espaço para discutir aqui os argumentos dos diversos autores, especialistas reconhecidos nos temas que abordaram, o que evidentemente não exime seus textos de eventuais reparos, lacunas e críticas, tarefa para a qual os leitores são instigados.

Anuncia-se para breve a continuidade da obra, comum segundo volume dedicado à recepção de teorias revolucionárias no Brasil, dentre as quais, as de Lukács, Gramsci e Trotski. Outro volume será dedicado ao estudo da elaboração de autores e correntes marxistas na interpretação da realidade brasileira, ficando um quarto tomo para a história das organizações marxistas.

Indica-se a História do marxismo no Brasil àqueles que querem conhecer melhor as bases em que se assentam as esquerdas de hoje. Especialmente aos petistas que, queiram ou não, são os principais herdeiros dessa História.

Marcelo Ridenti é professor do Departamento de Sociologia da Faculdade de Ciências e Letras da Unesp.