Estante

Essa obra é fruto de uma pesquisa levada a efeito pelo Diesat (Departamento Intersindical de Estudos e Pesquisas de Saúde e dos Ambientes de Trabalho), nascido em 1979 como órgão de assessoria sindical nas questões relativas a saúde e trabalho. Órgão de utilidade pública, não está subordinado a partidos políticos ou centrais sindicais. Suas pesquisas têm como base a demanda do movimento sindical na busca pela saúde do trabalho.

O livro analisa as patologias específicas de cada tipo de atividade industrial, que vão desde o desgaste mecânico devido à repetição dos mesmos movimentos físicos durante uma jornada de trabalho de oito a doze horas aos processos de degeneração orgânica associados a doenças ocupacionais, decorrentes do contato com substâncias tóxicas de todos os tipos.

É elevado o índice de mortalidade entre a população trabalhadora brasileira: na faixa entre quinze e 54 anos ela afeta 57% no sexo masculino e 37% no sexo feminino. Anualmente mais de 5 mil novas substâncias químicas são introduzidas no sistema industrial.

O livro mostra como os locais de trabalho aparecem envoltos em vapores de substâncias químicas, poeiras e névoas. Acresce o fato de a maior parte da poeira tóxica ser invisível, porém seu efeito cumulativo no organismo significa a morte lenta no trabalho. O país, em matéria de pesquisa toxicológica, está dando os primeiros passos.

A pesquisa analisa a Cosipa no setor siderúrgico, onde o ruído excessivo mistura-se ao calor, à intoxicação pelo benzeno, produzindo a leucopenia, só muito tardiamente reconhecida como doença profissional pelo Inamps. Contaram-se na empresa 2 100 leucopênicos. Essa doença resulta de uma alteração orgânica caracterizada pela diminuição do número de glóbulos vermelhos no sangue.

Foram encontrados trabalhadores sofrendo de benzenismo devido à exposição crônica ao benzeno, que é altamente tóxico e pode provocar a leucemia. A pesquisa analisa a exposição do trabalhador ao chumbo, que se traduz por impotência sexual, e mostrou níveis dessa substância no ambiente de trabalho mil vezes acima dos toleráveis.

O livro analisa a pesquisa realizada em São Caetano do Sul na Indústria Matarazzo, na seção dedicada à fabricação do agrotóxico BHC, onde o benzeno encontra-se no ar em alto nível de concentração, no nível de 1.000 ppm (partes por milhão), enquanto o limite permitido por lei é de 8 ppm!

O livro mostra a ação do dissulfeto de carbono e suas conseqüências sobre a saúde de um trabalhador exposto horas e horas a este produto altamente tóxico. Analisa a Cia. Nitro Química, onde em outubro de 1986, seiscentos funcionários do setor de fiação da empresa entraram em greve protestando contra as más condições de trabalho. Exames constataram excesso de ácido sulfúrico e sulfídrico, o que causara catorze casos de conjuntivite química entre os trabalhadores. Névoas de gás sulfídrico foram encontradas num nível de concentração 211 vezes acima do permitido por lei. Aliem-se a isso iluminação deficiente, calor e ruído excessivo. A fiscalização da Delegacia Regional do Trabalho é omissa e o sindicato não pode entrar na fábrica.

O livro aponta a seção de raiom com nível de ruído muito elevado e iluminação deficiente. A seção de dissulfeto de carbono era conhecida como "Ilha do Diabo" pelo calor excessivo e freqüentes explosões que causavam queimaduras entre os trabalhadores. A demorada exposição ao dissulfeto de carbono pode levar a pessoa à arteriosclerose, a sofrer de degeneração do fígado, de depressão do sistema nervoso central, o que, por sua vez, produz insônia, dor de cabeça, tontura, impotência, hipertensão e surdez.

Por ironia da vida, por ocasião da realização da Semana de Prevenção de Acidentes de Trabalho, um dos diretores da Eletrocloro declarava orgulhosamente que a mesma ostentava acidente zero e doença profissional zero; 48 horas depois, o Sindicato dos Trabalhadores Químicos do ABC denunciava a existência de 79 pessoas contaminadas por mercúrio.

Essa contaminação atinge o sistema nervoso central, causando distúrbios emocionais, alteração da memória, perda da coordenação dos movimentos, fadiga geral. Provoca inflamações na pele, sangria das gengivas e compromete o funcionamento dos rins.

Em suma, o livro, no seu conjunto, aborda o tema da poluição industrial no interior do sistema fabril e a necessidade de os trabalhadores se organizarem para lutar por seu direito à vida.

Mesmo em países de capitalismo desenvolvido, ocorre a falta de inspetores que façam cumprir adequadamente as normas. Quanto à legislação brasileira a respeito desse assunto, ela ainda deixa muito a desejar.

Verifica-se também no Brasil o sub-registro de doenças profissionais e a involução legislativa que limita cada vez mais o nível dos benefícios por doenças ocupacionais, que ao trabalhador caberia receber. O livro alerta os trabalhadores e seus sindicatos para a importância da luta pela saúde, tão importante quanto as campanhas salariais das várias categorias profissionais. É para ser lido e meditado.

Mauricio Tragtenberg é professor da Unicamp.