Até porque "toda imparcialidade é cínica", aqui vai a resenha mais cínica já feita sobre um livro no Brasil, a de O peixe morre pela boca, de Eugênio Bucci, jovem gênio da comunicação de massa, um que sabe verdadeiramente das coisas. Por ter o resenhista a figura do autor como um dos santinhos de seu altar, foi extrema ousadia de Teoria & Debate convidá-lo para fazer isso de vir dizer - de cara - que seu trabalho é parcial, inteiramente a favor do livro e do seu autor.
Para terminar esta introdução tão pouco ortodoxa, digo em meu favor que meu cinismo é proporcional à honestidade com que procuro nortear tudo o que faço.
Então vamos à resenha, cínica ou não. Em O peixe morre pela boca o autor prova seu pleno conhecimento da área em que atua profissionalmente e também sua coragem pessoal, como admite José Castello em "Bucci defende a modéstia na mídia" (O Estado de S. Paulo, 5/6/93 ):
"Devemos festejar um livro como O peixe morre pela boca, coletânea de oito ensaios do corajoso jornalista Eugênio Bucci, 34 anos, atual editor da revista Playboy, (...) O livro não interessa apenas a jornalistas, mas também a seus leitores, para que possam ler revistas e assistir televisão, sabendo que, no fim das contas, somos todos homens - tentando acertar.
Adorei a resenha de José Castello, à exceção de uns trechinhos...
Agora, vou citar outra resenha, esta de Fernando José Dias da Silva, no Jornal da Tarde (5/6/93), sob o título "Televisão e cultura ou televisão versus cultura?", em que ele diz a certa altura:
"Apesar de tudo, segundo o autor, a televisão não tem o poder de manipular consciências, até por ser considerada um veículo 'frio', ao contrário do rádio, um veículo 'quente'. Talvez o artigo em que Eugênio Bucci vá mais fundo seja o intitulado 'Da pancadaria explícita à violência invisível', texto originário de uma palestra feita no seminário 'A violência e a margem' (promovido pela Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo), em março de 92. Nessa parte do livro, o autor procura identificar a violência subterrânea contida nas imagens veiculadas pela televisão, isso porque a violência ao se tornar espetáculo deixa de fazer parte do mundo real, deixa de ter o objetivo de 'destruir, ofender e coagir', para divertir, entreter, informar, e não teria o poder (ao menos o poder monstruoso que se supõe normalmente) de produzir mais violência."
E teria eu de citar mais, não só o Dias da Silva como o Castello e outros tantos que resenharam o livro-tratado de comunicação de massa de Eugênio Bucci, que conheço desde os tempos de sua campanha visando a Presidência do Centro Acadêmico XI de Agosto, da Faculdade de Direito da USP, que ele ocupou efetivamente no período de 83/84. Foi aí que dei a Eugênio o título de gênio, bobagem em seu entender e honestidade minha (no meu), por causa do nome inventado pelo Eugeninho para sua chapa: The Pravda. Primor criativo no campo da Academia, tão conservadora, coitada.
Para mim, a televisão em qualquer regime ou sistema de governo é, apenas, uma arma inaprimorável, isto é, anua de fogo - não adianta você usar silenciador ou, se houvesse, projéteis já contendo em sua ponta poderoso anestésico, para tornar indolor a penetração do mesmo nos corpos atingidos pela pontaria do seu portador. Uma arma de fogo é sempre algo ameaçador que, além de intimidar, fere e mata. Assim é a televisão no meu fraco entender: arma poderosíssima - apontada para todos nós, quase sem exceção.
Digo quase porque eu, apesar de trabalhar há vinte anos na Globo - sobre quem todas as verdades parecem mentiras, e estas verdades absolutas, tal é a grandiosidade dela em si, como parte maior (e principal) de gigantesco complexo de comunicação de massa dirigido por Roberto Marinho, santo para uns, diabo para outros - jogo nos dois times, tá?
Enfim, do livro do Eugênio Bucci já não há mais o que dizer, além de eu considerá-lo divino, fantástico, maravilhoso, completo, sem defeitos nem nada.
Além das coisas da consciência, outras me ligam ao autor sendo a primeira delas o PT, nosso partidinho insolente e que nunca, jamais, em tempo algum há de se constituir num partidão indolente.
Ah, no livro (precioso) do Bucci, está também a respeitabilíssima figura de Perseu Abramo, petista de primeira hora e de sempre, que é professor do departamento de jornalismo da PUC/SP, e que escreveu as orelhas do livro, para o qual, se tivesse sido consultado, teria sugerido outro título: "Em boca fechada, nem dentista mete a mão", que tal?
Pois é: encerro esta resenha parcial, parcialíssima, expondo o que penso da TV (só mais um pouquinho, não se preocupem): a televisão estatal dá ao cidadão o que o Estado acha que ele deve ver; já a comercial, esta dá ao telespectador o que se sabe que ele quer ver. Bom, a minha televisão, se um dia viesse a gostar da coisa, seria aquela que só mostraria tudo aquilo que ninguém jamais sonhou ver. Que tal, hein? Ainda bem que - falou TV - eu passo...
Vale a pena relembrar: o livro do Bucci é imperdível.
Carlito Maia é publicitário.