Sociedade

Pesquisa sem precedentes, realizada pelo Núcleo de Opinião Pública da Fundação Perseu Abramo, revela o que faz e o que pensa a juventude das regiões metropolitanas

Duas idéias básicas costumam estar presentes nas concepções sobre juventude: a primeira consiste em considerá-la uma fase de passagem no ciclo da vida, situada entre o período de dependência, que caracterizaria a infância, e a posterior autonomia adulta. A segunda é a que atribui aos jovens uma predisposição natural para a rebeldia, como se fossem portadores de uma essência revolucionária. Pretendemos problematizar essas noções à luz dos resultados de uma pesquisa quantitativa realizada pelo Núcleo de Opinião Pública (NOP) da Fundação Perseu Abramo em novembro passado, junto a jovens (entre 15 e 24 anos) residentes nas nove regiões metropolitanas do país e no Distrito Federal1.

A concepção de juventude como passagem parte do reconhecimento de que se trata de um período de transformações e por isso de buscas e definições de identidade, de valores e idéias, de modos de se comportar e agir. Disto decorre a percepção da juventude como momento de instabilidade: intensidade e arrojamento, por um lado, turbulência e descaminhos, por outro. A resposta mais evidente a essa percepção sugere que tal momento de transição deva ser centrado na preparação para a vida futura, sobretudo via formação escolar, de modo a garantir uma adequada inserção na vida social – sob rígido controle dos adultos, é claro –, para que as buscas e inquietações não levem a "desvios".

Mas para ser bem realizada, essa preparação suporia uma suspensão ou retardamento da entrada em vários âmbitos e funções da vida social, como o trabalho, as obrigações e compromissos familiares, econômicos e civis. Assim, por essa ótica, durante muito tempo só foram considerados efetivamente "jovens" (como condição social, para além da definição meramente etária) aqueles que podiam viver tal suspensão, proteção e preparação – quase exclusivamente, portanto, os jovens das classes médias e altas, caracterizados principalmente por sua condição de estudante. Os jovens das classes populares, tendo de trabalhar e interrompendo os estudos muito cedo, ou a eles nem tendo acesso, ficaram excluídos dessa construção, como se vivessem a juventude em negativo.

Por sua vez, principalmente na tradição da esquerda, criou-se uma forte relação entre a ausência de compromissos sociais (dada pela "suspensão" temporária das funções e responsabilidades), com uma maior disponibilidade dos jovens às mudanças culturais e políticas. Assim, a juventude passou a ser definida como essencialmente rebelde, revolucionária, sempre pronta a propor utopias transformadoras – concepção já presente no início do século XIX, que se renova e se consolida nos anos 60 deste século, com a mobilização juvenil, de dimensão internacional, expressa nas imagens do hippie em comunidades alternativas ou do estudante em passeata.

Essas concepções, em separado ou tomadas como complementares, são insuficientes para se fazer qualquer diagnóstico ou consideração sobre os jovens no Brasil de hoje. Posto que a maioria deles não tem condições de se ver livre de obrigações e compromissos de ordem econômica e familiar, estando longe de ter sua vida centrada no estudo, ao levantar os temas que afetariam a juventude brasileira, o primeiro enfoque pouco consegue se desprender da imagem do antijovem. Os dramas, riscos e desvios tomam o primeiro plano da caracterização, cunhando a imagem de um jovem ora como vítima, ora como produtor de gravíssimos problemas sociais: as drogas, o crime, a prostituição, a gravidez precoce, a violência das gangues etc.

Por outro lado, também se tem a impressão de que a atual geração de jovens (e isso já duraria pelo menos duas décadas) se apresenta como a negação da essência juvenil, concebida como rebeldia. Comparados com as gerações dos anos 60 e 70 (sempre lembradas miticamente, como se em sua totalidade tivessem se envolvido nas mobilizações por mudanças), os jovens de hoje parecem estar no pólo oposto do compromisso político e da postura rebelde e revolucionária.

Esta pesquisa teve como fim subsidiar o entendimento do que tem sido a vivência da condição juvenil no Brasil de hoje, suas questões, dificuldades e potencialidades, posturas e posicionamentos, a partir do relato de suas opiniões, investigando seus interesses, preocupações e a percepção que têm de si mesmos e da sociedade em que estão inseridos.

Estudo e trabalho

É preciso ver a condição juvenil não só pela vida estudantil – válida para apenas pouco mais de metade dos jovens (58%) – mas simultaneamente pelo mundo do trabalho, com o qual a grande maioria (78%) já tem ou busca contato. Os dados apontam ainda a dificuldade dos jovens – às vezes impossibilidade – de compatibilizarem as condições de estudante e trabalhador/a.

Entre os 42% que já pararam de estudar, apenas 1% o fez por ter chegado à formação completa, de 3º grau (2% interromperam o curso superior, 6% estão cursando), e somente 30% concluíram o ensino médio (18% o abandonaram) – formação que, dada a proporção da faixa etária, 18 anos ou mais, deveria ter sido atingida por 69%. Cerca de metade dos que pararam de estudar (51%), o fizeram no máximo ao fim do ensino fundamental, dentre os quais 12% sequer ultrapassaram a 4a série. Para os adolescentes (de 15 a 17 anos), embora a condição de estudante esteja mais presente (87%), é grave constatar que cerca de um em cada oito desses jovens das regiões metropolitanas já está fora da escola.

Indagados sobre os motivos do abandono dos estudos, as duas principais razões citadas são econômicas: "comecei/precisei trabalhar/fiquei sem tempo para estudar", mencionada espontaneamente por 34% (por 47% dos rapazes e 23% das moças), e "falta de condições financeiras para pagar os estudos" (16%). O terceiro motivo é "gravidez/casamento", citado por 13% (23% das jovens que pararam de estudar, 1% dos jovens); 10% alegam desinteresse pela escola, 8% declaram-se satisfeitos com o grau concluído e 5% desistiram depois de barrados no vestibular.

E de fato, cerca de quatro em cada cinco jovens brasileiros metropolitanos estão ligados à esfera do trabalho: em novembro de 1999 apenas 22% não trabalhavam nem buscavam emprego; 36% estavam trabalhando e 42% desempregados – 32% já tinham trabalhado e 10% tentavam ingressar no mercado. Mesmo entre os adolescentes (de 15 a 17 anos), só 47% nunca tinham procurado emprego; 17% estavam trabalhando (24% dos meninos, 10% das meninas), 15% procurando seu primeiro emprego e 21% já desempregados.

Corroborando a pressão de fatores econômicos para a entrada dos jovens no mundo do trabalho, perguntados sobre os destino da renda obtida no emprego (atual ou último, se desempregado), dois em cada três jovens economicamente ativos afirmam contribuir para o complemento da renda familiar (66%), seja com uma parte (57%) ou com tudo o que ganham (9%, taxa que atinge 21% entre os jovens com renda familiar até dois salários mínimos).

Mas diferentemente do que parece, a relação do jovem com o trabalho envolve outros fatores, além da pura necessidade de sobrevivência. É meio tanto para a própria formação profissional e, quando compatível, para a continuidade da formação escolar (dado que a maior chance de fazer cursos técnicos e escolas de 3º grau está na rede privada), como permite a vivência da condição juvenil em outras esferas: a sociabilidade e a possibilidade de fruir atividades de lazer e cultura, inclusive realizando os consumos simbólicos que costumam acompanhá-las (roupas, aparelhos eletrônicos etc.). Ligado a isso, o trabalho tem o sentido de realizar o desejo de maior independência em relação aos pais, até no que diz respeito a critérios e prioridades de gastos. Ou seja, trabalho é necessidade, mas também condição de prazer e de autonomia.

Esse conjunto de fatores explica por que há bem mais jovens satisfeitos (37% muito, 38% um pouco) do que insatisfeitos (10% um pouco, 7% muito) com o trabalho que têm, não obstante as condições de exploração de sua entrada no mercado (54% com vínculo precário, 66% com jornadas de 8 horas ou mais, 77% percebendo no máximo três salários mínimos). Entre as principais razões espontaneamente alegadas para essa satisfação, despontam a valorização dos relacionamentos proporcionados pelo ambiente de trabalho (15%), o gosto pelas atividades que desenvolvem (14%) e a percepção de ganhos na forma de aprendizado e aperfeiçoamento (6%), além da esperada satisfação com a renda obtida, sempre bem-vinda, por pequena que seja (17%, sendo que neste item 7% ressaltam "ter o próprio dinheiro").

Em suma, não se pode dizer que o que caracteriza a situação juvenil nas áreas metropolitanas brasileiras hoje é a condição de estudante, mas tampouco que o trabalho apareça somente como a negação dessa condição. Essa percepção é importante para se compreender a relevância do tema do desemprego – junto com a violência, o principal tema de preocupação, presente em muitas das respostas dos jovens.

Ser jovem, segundo os jovens

Ter liberdade para se divertir, com o adiamento ou minimização de responsabilidades familiares e financeiras é, para a maioria dos jovens, o elemento central da condição juvenil: é quando as responsabilidades impedem a diversão (26%) ou quando se casa ou passa a ter compromissos conjugais e filhos (26%) que acabaria a juventude. A diversão, uma sociabilidade mais livre e a vivência cultural caracterizam a juventude para a maioria de seus protagonistas. Em contraponto a essas percepções, conotações negativas também aparecem, mas em grau bem menor, como fase ligada a diversos riscos, dados pela proximidade com drogas (8%) e violência (7%), o trabalho como obrigação (6%) ou sua falta (6%).

A avaliação da maioria dos jovens metropolitanos sobre a fase da vida que atravessam é positiva: 61% dizem que há mais coisas boas do que ruins em ser jovem, 16% avaliam que há mais coisas ruins e para 23% as coisas boas e ruins se eqüivalem – percepção com razoável influência de classe, posto que a taxa dos que vêem mais elementos positivos em sua condição juvenil cai de 68% entre os jovens com maior renda familiar para 50% entre os de menor renda, enquanto a avaliação de que há mais elementos negativos aumenta, respectivamente, de 10% para 25%. A avaliação positiva também é maior entre os adolescentes (65%, contra 59% entre os maiores de 18 anos) e entre os rapazes (65%) do que entre as moças (57%).

Perguntados sobre "qual é a melhor coisa em ser jovem", aparece com força a idéia de que essa é uma fase em que se pode "aproveitar a vida, curtir, se divertir" (citada por 25%). A essa resposta se juntam outras, em que a dimensão do prazer também aparece como central: namorar sem compromisso (14%), ter amigos (5%), dançar (5%) etc. A ausência de responsabilidades e compromissos com cônjuges e filhos (14%), "poder estudar/só estudar" (13%) e "ser livre" (11%) também surgem entre as principais citações positivas.

Já entre as coisas ruins, os problemas e riscos, predominam: as drogas (25%), o desemprego (9%), a violência urbana (6%), o envolvimento com o crime (5%) e o "envolvimento com as más companhias" (8%), mas há ainda o controle dos pais (9%, taxa que chega a 15% entre as adolescentes, contra 9% entre os adolescentes) e a falta de independência econômica (6%).

Apesar do peso e gravidade dos problemas que atravessam a condição juvenil, os jovens não estão entregues à tristeza ou ao desespero. Ao contrário: 45% se dizem "muito satisfeitos" com sua vida, e outros 37% se dizem "mais ou menos satisfeitos". Essa satisfação relativa com o presente vem acompanhada de uma postura que mescla otimismo, incerteza e pessimismo com relação ao futuro. Num determinado plano, os jovens esperam muito do seu próprio futuro, embora sejam bastante pessimistas com a situação do país e do mundo: 88% acham que sua vida pessoal vai melhorar, enquanto que com relação ao mundo e ao Brasil somente 28% e 31%, respectivamente, acham o mesmo. Refletindo a introjeção da ideologia individualista dominante, que supõe universalizável a atitude de cuidar só de si como caminho para que o todo melhore, os jovens fundam tal otimismo na convicção de esforço pessoal: 33% dizem que vão melhorar como conseqüência de sua inserção profissional, 11% por causa de seus estudos e mais 20% por causa de seu empenho.

Cultura e lazer

Nas respostas sobre o que fazem no seu tempo livre, ressalta-se a predominância de atividades de diversão, de passeio, de fruição de bens da indústria cultural e dos meios de comunicação de massa, em contraste com baixíssimos graus de fruição de formas de cultura erudita ou não industrializada (como museus, teatro, exposições de fotografia, espetáculos de dança etc.).

A primeira impressão que se tem, portanto, quando se observa o modo como os jovens usam o tempo livre, vem reforçar idéias correntes sobre a "miséria cultural" da juventude, como uma geração guiada antes de tudo pelo consumismo e pelo modismo, escravizada pela TV. Infelizmente, esta pesquisa não permite conferir até que ponto os jovens se diferenciam dos adultos nessa postura, ou apenas reproduzem o padrão adulto (como é nossa hipótese), hoje predominante no Brasil.

São as atividades que se montam no cruzamento dos campos da diversão, da cultura e do esporte, que ocupam a maior parte das horas livres dos jovens. Pelas respostas espontâneas às perguntas sobre o que fazem com mais freqüência nas horas livres, vemos que fruir TV ou rádio é, durante a semana, a atividade referida pela maioria (57%), assim como ouvir música (37%). Já nos fins de semana, as horas livres são ocupadas com atividades fora de casa (embora TV e rádio, assim como ouvir música, continuem presentes, 27% e 18%, respectivamente): "sair com amigos" (29%), "ir a danceterias ou a shows" (25%), "jogar futebol ou vôlei" (21%), "passear" (19%), "namorar" (20%).

A importância da música também aparece quando constatamos que 77% dizem ouvir rádio diariamente. E, aqui, diferentemente da imagem cunhada do jovem submetido aos modismos dos meios de comunicação dominados pela indústria cultural norte-americana, constatamos que os jovens ouvem principalmente música brasileira: pagode, MPB, samba, sertanejo, axé.

Em resposta a uma bateria estimulada de atividades de lazer, também aparecem como mais freqüentes aquelas que se fazem com amigos, em que a sociabilidade é o motivo maior (passear, ir a festas, shoppings, bares, ou lanchonetes, dançar), que não envolvem gastos ou que propiciem a busca de parceiros, as paqueras, os namoros.

As atividades "culturais" que vêm num segundo plano são principalmente aquelas ligadas à cultura industrial, o cinema (parece pequena a freqüência mensal – só 24% foi a cinema nos últimos 30 dias, mas se somarmos com a freqüência no ano, mais da metade foi ao cinema no espaço de pelo menos um ano) e também os shows de música brasileira ou rock. Já as atividades ligadas à cultura não industrial ou erudita são pouquíssimo citadas. Muitos e diversos devem ser os motivos para essa baixa freqüência; alguns deles ligados às limitações financeiras, outros às ofertas existentes, e outros ainda ao universo de informações que forma as referências dos jovens.

Finalmente, cabe notar o expressivo contingente de jovens que conhecem e acompanham as atividades de outros jovens e/ou se auto-organizam em grupos ligados a atividades culturais e de lazer. Afirmam conhecer algum "grupo cultural jovem no seu bairro ou comunidade" 56% dos jovens metropolitanos, sobretudo grupos de música (33%), mas também de dança (15%), patins ou skate (13%), teatro (12%), ciclistas (11%), pichadores (11%), grafiteiros (9%) e de rádios comunitárias (5%). São membros de algum grupo dessa natureza 11% dos jovens (cerca de 1 milhão, na soma das áreas metropolitanas pesquisadas), com destaque para os grupos de música (4%), dança (2%) e teatro (2%), e não são membros mas participam de suas atividades (como espectadores ou acompanhantes) outros 6%.

Trata-se de um grau de auto-organização e mobilização em torno de atividades culturais e de lazer que, embora minoritário, supera a participação em atividades de cunho político, pelos diferentes canais institucionais disponíveis.

O lugar da política

Passados os períodos de maior mobilização dos anos 60 e 70, em que movimentos de jovens, sobretudo estudantes, irromperam com força na cena política, para onde teriam ido os jovens brasileiros das gerações seguintes? Os jovens das décadas de 80 e 90 seriam mais alienados que os das gerações que os antecederam? Que lugar ocupa a política para o jovem brasileiro de hoje?

A pesquisa indica que os jovens das regiões metropolitanas situam hoje a política em um ponto intermediário, não de extrema importância, mas tampouco irrelevante. Em resposta espontânea e múltipla à pergunta aberta "quais os assuntos que mais lhe interessam atualmente?", "política" aparece em 7o lugar, citada por 11%, no mesmo patamar que questões de "saúde" (10%), "economia" (9%) e "segurança/violência" (9%). Bem abaixo, portanto, de temas ligados a "emprego" (37%), "educação" (30%), "cultura e lazer" (27%), "família" (25%), "relacionamentos/amizades" (22%) e "esportes" (20% – este o segundo de maior interesse dos rapazes, 34%, mas o 11o de interesse das jovens, citado por apenas 7%).

O interesse secundário por política não significa, no entanto, o não reconhecimento de sua importância – caso em que, então sim, se poderia admitir, como hipótese a investigar, a idéia de alienação. Em uma seqüência de perguntas em que se solicitou aos jovens que indicassem entre os dez temas acima os três "que mais gostariam de discutir com seus/as amigos/as", inicialmente "política" apareceu outra vez no fim da lista (em 9o lugar, com 13%, junto com "ecologia", 12%). Já entre os temas "que mais gostariam de discutir com seus pais ou responsáveis", "política" melhora um pouco de posição (7o lugar, citada por 23%), aparecendo junto com "racismo" (25%), à frente de "esportes" (17%), "artes" (13%) e "ecologia" (9%). Finalmente, entre os temas "que acham mais importantes para serem discutidos pela sociedade", "política" salta para o 1o lugar, citada por 48% dos jovens, junto com "desigualdade social e pobreza" (45%), à frente de "educação" (42%) e "drogas" (41%).

Em resposta à pergunta sobre a importância da política, metade dos jovens disse considerá-la muito importante; 26% mais ou menos importante e apenas 20% nada importante. Indagados do porquê não dão importância à política, a quase totalidade das justificativas revela um deslocamento da política para os políticos: a política não é importante, argumentam, porque "não cumprem nada do que dizem/ não resolvem nada" (38%), "são todos corruptos/ladrões" (27%), "só os políticos ganham salários altos" (8%), "tudo é mentira" (9%).

De fato, o reconhecimento do papel das instituições políticas (boas ou ruins) e a distinção da política como ideal de atividade humana em substituição à violência na mediação de conflitos, só são possíveis a partir de um olhar que vá além das formas concretas predominantes com que a política institucional e profissionalizada tem mostrado sua cara. A dificuldade para esse exercício de abstração explica por que a noção de que a política não é importante é partilhada por expressivos 25% dos jovens que não ultrapassaram o ensino fundamental, mas apenas por 8% dos que concluíram ou cursam o ensino superior. De forma semelhante, em cada três jovens investigados, há dois que reconhecem que a política influi em suas vidas (33% acham que "influi muito", outros 33% "um pouco") e um acha que "não influi" (31%) – percepção irrealista manifesta por 40% dos que não cursaram além da 8a série e por apenas 7% dos que chegaram à faculdade.

Mas se a maioria dos jovens reconhece a importância social e a influência da política em suas vidas, ao se inverter a pergunta – indagando sobre o grau de influência que eles exercem sobre a política – os resultados apontam para um problema de outra ordem: o descolamento entre as instituições políticas e seu cotidiano, levando-os a ver a política como algo distante, quando não inalcançável. Menos da metade (39%) acredita ter influência sobre a política (26% acham que influem "um pouco" e apenas 13% que influem "muito"), contra 56% que acreditam não influenciá-la (taxa que varia de 38% entre os mais escolarizados a 66% entre os menos escolarizados). Também expressão desse distanciamento, para muitos a política é importante, sim, mas para ser feita por outros: concordam totalmente (25%) ou em parte (18%) que política é algo a ser feito "só por profissionais, como deputados e senadores" 43% dos jovens (51% dos que não ultrapassaram o ensino fundamental e 21% dos que chegaram ao ensino superior).

Os dados sugerem, pois, que não são os jovens que não sabem da relevância da política, mas antes a forma predominante de se fazer política no país que não os reconhece como interlocutores, gerando em muitos deles indiferença ou aversão. As respostas dos que afirmam exercer influência sobre a política são sintomáticas a respeito: quase 2/3 referem-se apenas a atividades vinculadas a eleições, dentre elas quase que estritamente o exercício do voto (55%). Considerando-se a pobreza do modelo liberal da democracia vigente, talvez o surpreendente seja que parte dos jovens demonstre algum grau de interesse pela política.

Por fim, esta pesquisa constatou baixa taxa de participação em atividades políticas e afins: apenas 4% dos jovens que estão estudando participam de centros ou diretórios acadêmicos, só 3% dos que estão trabalhando têm algum vínculo com sindicatos ou associações profissionais, 8% participam de reuniões de partidos políticos, mas antes eventualmente (6%) do que sempre (2%). Trata-se de níveis de participação inferiores aos observados em relação a grupos de jovens auto-organizados em torno de atividades culturais. Isto aponta um caminho para o diálogo com os jovens e a reversão desse quadro: o desenvolvimento de políticas públicas de lazer e cultura voltadas especificamente para eles – uma tarefa já iniciada por muitas prefeituras petistas (ver o exemplo, nesta edição de Teoria e Debate, da resposta expressiva dos jovens de Belém ao Orçamento Participativo da Juventude), e urgente para os novos governos de esquerda que devem se eleger em outubro.

Gustavo Venturi é coordenador do Núcleo de Opinião Pública da FPA.

Helena Abramo é socióloga.