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Com o golpe, passou a interessar ao partido uma juventude mobilizada, capilarizada, que vai para as ruas fazer barulho e despende menos tempo nas sedes e gabinetes

A juventude do Partido dos Trabalhadores está em pleno processo de organização e mobilização para seu quinto congresso, lançado na semana da juventude em agosto de 2021. Passadas as etapas municipais, ao longo do mês de novembro ocorrem os encontros estaduais para, entre os dias 10 e 12 de dezembro, ser realizada a etapa nacional. O 5oCongresso da JPT tem como tema "Uma juventude de muitos sonhos e uma mesma luta" e tem mais de 114 mil jovens credenciados em todo o país.

O Congresso da JPT se dá concomitantemente às eleições dos quase vinte setoriais e secretarias temáticas do partido. Os setoriais são uma prova de que o PT é um partido vivo, que existe não apenas no e para o período eleitoral. Possui dinâmica própria, alinhada com as agendas dos movimentos e das organizações populares do Brasil e da América Latina. Com a juventude não poderia ser diferente.

Para o 5o Congresso foram inscritas 13 teses, que representam a pluralidade da JPT: i) Esperançar a juventude - Lula para avançar na construção do Socialismo, do Socialismo em Construção; ii) Eu quero é botar meu bloco na rua, do Disparada; iii) JPT do tamanho dos nossos sonhos, da Articulação de Esquerda; iv) Fazer brilhar nossa estrela, da Construindo um Novo Brasil; v) Juventude da Avante, de esquerda e militante! do Fora da Ordem/Avante; vi) Juventude popular do PT, lutando bravamente por direitos e esperança, da Esquerda Popular Socialista; vii) Mais do que resistir, é hora de revidar, da Democracia Socialista; viii) Movimentando a juventude para ocupar o Brasil, do Movimentação Popular/MPT; ix) Não somos o futuro do país, somos o país: não agencie a Juventude, porque sabemos quem somos - Paulo Freire nos esperancia!, da Militância Socialista; x) Não temos tempo a perder, do Coletivo Malês/PT de Todas as Lutas; xi) O que está em jogo no 5o Congresso da JPT?, da Juventude Revolução; xii) Se eles não faz, nóis faz, do Movimento Popular de Juventude; e xiii) A juventude virando a mesa do poder, da Resistência Socialista.

Muito embora o processo de inscrição das chapas ainda esteja em aberto, já há sinalizações de que as três candidaturas à Secretaria Nacional de Juventude do PT serão de mulheres: Marina Gissi (MG), da Resistência Socialista; Luci Souza (RJ), da Democracia Socialista, e Nádia Garcia (GO), da Construindo um Novo Brasil. Assim, com muito orgulho, nos despedimos de nosso atual secretário, Ronald Sorriso (RJ) que nos últimos anos fortaleceu muito a juventude e tocou a gestão ao lado das secretárias adjuntas Luci Souza e Alana Manchineri (AC), e demais membros da JPT.

Ao olhar para esse processo, me anima muito ver o entusiasmo e o compromisso da juventude que me acolheu e que ajudei a construir desde 2008, quando comecei a militar mais organizadamente no PT. O Brasil e o mundo mudaram bastante de lá para cá e muitos são os desafios que acompanham essas transformações.

Uma das principais mudanças foi o aumento da conectividade. A militância hoje é indiscutivelmente uma combinação de ruas e redes e a juventude é o segmento que mais experimenta e inova nesse sentido. No que tange ao cenário político, ou melhor aos retrocessos democráticos, em curso no Brasil desde o golpe de 2016, foram vários os desafios impostos à juventude. O aumento da pobreza, do desemprego, da informalidade e a perda de direitos trabalhistas são fatores que influenciaram diretamente na vida das juventudes brasileiras e de suas famílias. Da mesma forma, o recrudescimento e a extinção de políticas públicas (a mais recente delas o Bolsa Família), em especial de educação, impactaram negativamente as perspectivas de futuro e impuseram um cotidiano de busca de sobrevivência aos jovens. Com isso, menos tempo pode ser dedicado para a militância, para a formação e para atividades próprias da vivência juvenil.

No caso das mulheres, as tarefas de cuidado (da casa, de crianças, idosos, doentes) restringem ainda mais o tempo disponível para qualquer atividade que não o trabalho. Outro segmento muito impactado, que acompanho mais de perto, é a juventude rural. Em 2016, logo antes do golpe, foi lançado o Plano Nacional de Juventude e Sucessão Rural (extinto por Bolsonaro em 2018), fruto da construção de anos de dezenas de coletivos e organizações sindicais e populares do campo, das florestas e das águas. De lá para cá, muitos jovens precisaram se afastar da construção cotidiana dessas organizações, de tal forma que a juventude rural resiste, mas a perda de fôlego e de condições para a atuação política é gritante.

No caso da juventude partidária, e da JPT em particular, um outro aspecto merece destaque, ligado aos planos da organização e da mobilização. Enquanto estivemos no governo federal, a JPT se dedicou muito à formação de quadros e à elaboração de políticas públicas. Pelo menos desde 2003 em diante, às direções partidárias petistas interessava uma juventude combativa ma non troppo. Falava-se mais em elaboração, proposição de políticas públicas, fortalecimento do Conjuve e organização das Conferências de Juventude e apostava-se no movimento estudantil (mas sem ameaçar a liderança da UJS, a juventude de nosso principal parceiro na esquerda, o PCdoB). Na mesma linha, no PT, uma novidade potente e transformadora, conquistada pela geração que me precedeu, foi a instituição de cotas para as juventudes em todas as instâncias. Não há dúvidas que essa mudança impulsionou novas conquistas, apesar de em algumas ocasiões ter favorecido perfis juvenis que pouco destoavam das lideranças mais antigas já instituídas.

Com o golpe, quase que do dia para a noite, passou a interessar ao partido uma juventude mobilizada, capilarizada, que vai para as ruas fazer barulho e despende menos tempo nas sedes e gabinetes petistas. Passou a interessar ao partido um perfil mais próximo do que seria uma juventude-movimento. Ocorre que não se muda a cultura política de uma geração dessa forma. Sobretudo quando consideramos que um dilema parecido é vivenciado pelo conjunto do partido. Ainda hoje, mais de cinco anos após o golpe, ainda há resistências individuais e coletivas na adaptação entre uma postura que antes era de governo e passa a ser de oposição. Ouso comentar que até hoje boa parte de nossa bancada no Congresso não recuperou ou reinventou a postura combativa que tínhamos nos anos 1990.

Se é preciso reconfigurar nossa postura, há que se considerar que "fomos saídos" do governo federal, mas ainda governamos quatro estados e mais de 180 prefeituras. Também somos o partido que mais elegeu vereadoras/es jovens em 2020 (573), muito em razão do trabalho do Movimento Representa, o programa de apoio e incentivo às candidaturas jovens no PT. Ou seja, não podemos e não devemos abandonar o acúmulo da JPT no âmbito das políticas públicas.

A boa notícia é que nem tudo está perdido e as derrotas impostas ao campo popular e às juventudes em particular trazem retrocessos, mas não voltamos à estaca zero.

Em meio a tantas mudanças, diversas pesquisas qualitativas mostram que uma coisa permaneceu: a percepção das e dos jovens como sujeitos de direitos. A noção de direitos, inclusive do direito de viver a juventude, inscrito no Estatuto da Juventude – promulgado pela presidenta Dilma em 2013 –, é algo muito concreto para a juventude trabalhadora brasileira. Assim, em meio a tantas mudanças e desafios, cabe afirmar que segue válido e muito atual o lema da JPT: socialista, democrática e de massas.

Viva a juventude do PT! Uma juventude de muitos sonhos e uma mesma luta!

 

Luiza Dulci é militante da JPT, integra o Conselho Curador da Fundação Perseu Abramo. É economista (UFMG), mestre em Sociologia (UFRJ) e doutora em Ciências Sociais, Desenvolvimento e Agricultura (UFRRJ)